Por Guilherme César
--------------------------------- NÃO CONTÉM SPOILERS ---------------------------
[Crítica/Análise]
Cargo: O Filme de zumbis da Netflix que pode te fazer chorar
Sou
um fã confesso da temática pós-apocaliptica envolvendo os mortos-vivos. Depois
de muitos filmes do subgênero terror-zumbi, eis que me deparei com um recém-chegado
na Netflix, o filme Cargo. A sinopse do longa já me ganhou, tratando-se da
história de um pai que precisa proteger sua filha em meio ao apocalipse zumbi
na Austrália. Porém, foi ao assistir os primeiros minutos que percebi que este
não era mais um filme banal de terror, não, desta vez as criaturas eram apenas
um plano de fundo de algo incrivelmente emotivo.
Primeiramente
vamos falar sobre o filme. A história é baseada em um curta-metragem lançado no
YouTube em 2013 e agora produzido pela Netflix. Dirigido e roteirizado pelos
mesmos criadores do curta, a trama se passa inteiramente na Austrália, mostrando
a luta incessante de um pai para proteger sua filha e levá-la até um local
seguro.
Com
pouquíssimos personagens e com Martin Freeman (o Bilbo de O Hobbit) no papel
principal, temos um enredo que se desenvolve lentamente, deixando de lado os
sustos e momentos clássicos presentes nos filmes de zumbi. Aqui temos uma
história que é focada inteiramente nos personagens, apresentando grau a grau da
transformação, numa crescente de desespero que é primordial para prender o
espectador.
Se
você gosta de ver hordas de mortos-vivos despedaçando humanos ou largas sequências
de sobreviventes fugindo e atirando, bom... é melhor ir assistir Madrugada dos
Mortos. Em Cargo o que temos é o drama, puro e cru, onde o principal motor são
as relações entre os humanos sobreviventes. Pouco se fala sobre a causa, sobre
o porquê aquelas criaturas vagam por todo lado. Pouco é explorado sobre a
origem, mas o filme apresenta sua própria mitologia, contendo características
únicas, como o fato dos monstros cavarem buracos para enterrar suas cabeças, num
ato instintivo de buscar a escuridão.
O
que achei muito interessante é na forma com que o longa funciona de maneira
diferente dos clássicos do gênero, focando na família, no sacrifício, na
compaixão e na desesperança. Mesmo com o ritmo lento, o filme é muito bom,
consegue nos prender e também plantar a angustia bem fundo em nosso peito. Na
tela temos um pai, em completo desespero, refém de uma situação sem volta, com
toda a sua esperança voltada para salvar sua filha. E a cada cena temos essa
esperança destruída e renovada, e sentimos a dor de Andy, o protagonista, que
vê minutos preciosos se esvaindo a cada chance desperdiçada.
Em
contrapartida temos Thoomi, uma pré-adolescente nativa das tribos australianas,
que tenta trazer de volta a vida o seu pai já zumbificado. O choque de cultura
entre Andy (o homem branco) e Thoomi que carrega a cultura de sua tribo,
proporciona um contraste que cativa. Em meio a isso vemos o preconceito que os aborígines
sofrem, a deterioração da moral humana perante um apocalipse e o desespero
(usando muito essa palavra) para proteger quem se ama.
O
visual por se só é aterrador. Grandes planícies ensolaradas e desérticas,
longas extensões de um sinuoso NADA, além dos lagos pantanosos a lá Crocodilo
Dante. A maior parte do longa se passa durante o dia, fugindo do estereótipo do
gênero, mas a própria ambientação já se encarregada de nos situar na desolação
de um cenário pós-apocaliptico.
Tem
sido comum em alguns filmes de terror mais recentes fugir do básico e se
mesclar ao drama, trazendo uma carga emotiva que por se só já é mais impactante
que os próprios sustos de tempos em tempos, como no recém lançado e muito bom “Um
lugar silencioso”. Essa tendência muito me agrada, pois focar no
desenvolvimento dos personagens, em como suas escolhas podem ser fatais e nas consequências
disso é realmente interessante. Cargo faz isso, de forma lenta e dolorosa,
quase arrancando lágrimas deste que vos escreve. Um filme que cativa, que nos
faz pensar em como o ser humano pode apodrecer ainda mais quando as leis já não
existem e em como também podemos ir além dos nossos limites por quem amamos.
Vale
destacar a ótima interação entre Andy e Thoomi que nos faz torcer por eles. A
bebê também é uma fofura e sua mãe, que no momento me falha o nome, tem uma
atuação incrível. Creio eu que todos os atores foram ótimos ao demonstrar o
desamparo e a degradação dos humanos no apocalipse. Cargo, para mim, mostrou-se
um filme bastante sensível quanto a natureza humana.
Assim
como em Um Lugar Silencioso, temos a importância da família e do sacrifício, do
amor e da compaixão, algo tocante e diferente em um terror. E em minha opinião,
o já desgastado subgênero dos mortos-vivos serve sim, de forma brilhante quando
usado apenas como um plano de fundo, um motor para a história. E ainda é possível
contar boas histórias em meio aos zumbis quando se foca nos humanos, no drama
pela sobrevivência e na manutenção da esperança. Acima de tudo, os filmes de
zumbi deveriam nos fazer refletir e não só nos aterrorizar.
Nota
7/10 para essa produção da Netflix que conseguiu ganhar um lugarzinho no meu
coração. Ótimo filme, ótima premissa e um respiro ao subgênero já bastante saturado,
mas não menos amado por nós.
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